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O Chato e a sociedade

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 O Chato e a sociedade

  Na madrugada de ontem para hoje, 03.06.2016 eu me senti um verdadeiro padre. Bem, esse ofício me foi dado em uma viagem em que eu estava fazendo. O local, para ser mais preciso, era uma poltrona de um boeing da TAM com destino a Brasília. Estava eu indo a Brasília para fazer uma conexão, pois o meu destino final era a grande Las Vegas. 

  Você pode estar se perguntando: "Onde entra a história do padre?". Calma, meu caro blog, primeiro tive que apresentar a situação. Dada, saibas que eu fui o padre por duas horas de um homem chamado... não sei se os padres podem revelar a identidade de quem entra no confessionário, então não posso te contar... O nome dele é Hipócrates, ofício passageiro o meu, literalmente. Esse nome, disse ele, é um homenagem ao primeiro médico e foi lhe dado por seus pais, que também são médicos, com o objetivo de moldar o filho para essa ciência desde o berço.

  E foi a partir a dessa simples cordialidade de breve comunicação com o seu companheiro de viagem que eu virei temporariamente santo, assim como os padres, quando entram na caixinha de madeira. No meu caso, era um luxuoso cubículo de plástico rodeada de ferro. Garanto-lhe que o confessionário deve ser mais confortável. Mas ainda assim é luxuoso, pois há muitos que ainda não o conhece, garantido o adjetivo.

  Branco, barba perfeitamente feita, camisa social, cabelo baixo nos lados e bem penteado em cima, bem arrumado, sapato aos trincos, postura perfeita e dentro dos padrões aceitáveis de músculo, melhor dizendo, ele se encaixava em todos os padrões sociais. Contudo, aconteceu:

— Como pode, não aguento mais, caro Saktikós. Disse ele, em um tom de lamento.
— Que te passas?
— A vida, ah! vida, maldita que me passa.
— Como? Não estou a te entender, pareces ser um homem bem sucedido. 

 Foi nesse momento que a estrutura perfeita de homem se desmoronou em lágrimas, essas que me faziam refletir sobre a probabilidade de embriaguez ou loucura. Loucura? Não pode ser, ele está arrumado, pensei. Mas ele também não se apresenta como um bêbado.

 Enquanto eu pensava, o cidadão iniciou um lamento que deve ter ultrapassado o de Napoleão quando invadiu a Rússia, o homem derramou o seu coração ao meu lado. Bulufas! Não sou médico. Fiz, é claro, o que todos fazem nessa situação: Olhei para ele, fiz gestos de interesse e o ignorei totalmente em pensamento. 

 Trinta minutos! Trinta minutos de melúria e fingimento. Melhor dizendo, acredito que uns 23 minutos; 7 ficaram para a reza e a benza que ele fez no momento da decolagem. Pois, é claro, os deuses nos ajudam em tudo, devia pensar o homem enquanto chorava ao meu lado.

 Depois de alguns instantes, um silêncio tomou conta do avião.

Ele me olhava diretamente e o seu comportamento esperava uma resposta:

— Então?

 Eu também estava olhando fixamente para ele, mas eu estava pensando nas ações da Petrobrás. Mas ah, boa experiência, já sou homem. Portanto, consegui rapidamente inventar uma história que pudesse fazer concordância com o que ele devia esperar que eu respondesse. Deu certo. Não me julgue de sem coração ou algo do tipo, algoritmos, me diga qual diálogo não é assim hoje em dia?

 Não sei o que respondi, não me lembro e não pensei, apenas sei que disse o que ele queria ouvir, algo que não deve vir acompanhado dessa conjetura. Porém, ele mostrou-se ainda mais instigado a falar:

— Você não sabe como essas palavras ecoam em meu coração, meu colega, pois saibas: Não segui a carreira médica, me formei em filosofia e matemática, segui a carreira acadêmica, sou Cristão, procuro fazer o bem sempre que posso, mas...

 Uma pausa. 

 Aproveitarei essa pausa para falar-te que nesse momento estava eu pensando: Chato. Será que ele não percebe que eu poderia estar agora assistindo algum filme, falando com alguém pelo meus aplicativos de comunicação, jogando ou até mesmo dormindo? Chato! Mas, como um bom clérigo, continuei a fingir que estava prestando atenção.

... Eu faço o que devo.
— Oras, como trazes isso em conjunto com um adversativo?
— Não entendes, Saktikós? Fala o que pensas e faz o que deve e serás enquadrado...
— Calma, calma, bom homem, não é assim, calma. Disse eu, como um bom padre. Pois sabendo o que viria, sabia que seria um ataque que me atingiria.
 ... de chato, ignorante, orgulhoso e todos os adjetivos que representem alguma desvirtude.

 "Soldado ferido, fui atingido." Meus pecados também estavam ali, mas eles estavam escondidos. E é por conhecê-los que eu poderia elaborar a melhor resposta. 

— Meu caro jovem - disse eu como um bom padre - nossa sociedade é assim mesmo. Veja, eles buscam apenas as aparências, querem ser reconhecidos, ter fama, dinheiro, querem ser vistos de um bom modo. "Bom", que palavra complicada. Deixe-me levantar uma pequena questão filosófica com você. O que é bom?

 Acredito que bom seja aquilo que esteja atribuída a uma boa ação.
— Estás certos em partes, ao mesmo tempo que muito enganado. Boa ação, sim. Mas a boa ação que temos em nossa sociedade não passa de um fingimento, hipocrisia e, quando menos, uma auto-enganação. Existe um padrão ignóbil onde nos temos que nos mostrar sempre perfeitos, homens de ferro, sem erros, não pode ser sério, não pode rir demais, não pode tocar... Dane-se! 

Quanta ironia, estava eu colocando tudo que eu era como um conselho para não ser seguido, talvez pela experiência. Sim, blog, errei. Disse a palavra que em minha posição eu só poderia fazer em pensamento. Dane-se.

— Você tem razão. Mas diga-me, o que fazer? Devo continuar a ser "chato", digo, correto?

Olhei para o relógio e vi que a nossa conversa tinha rendido, já estava eu perto de meu destino. Olhei por cima de minha poltrona e observei que tinham muitas ainda vazias. As palavras que aquele homem me tinha feito dizer e pior, pensar, me incomodavam e rasgavam minha alma, grande chato e infeliz. 

— Vou ao banheiro, licença. 

No entanto, enquanto eu saia, eu lhe disse rapidamente e com certo tom de furor:

— NÃO!

Saí, procurei outra poltrona e não voltei mais. Espero nunca mais vê-lo, que morra só! Passagem mais cara que comprei em minha vida, a viagem custou-me 700 reais e um espelho.

-Jonatas Carlos

Ainda não terminei a história, mas estou com preguiça.

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